Ouço o atendedor de chamadas a que és fiel desde que me lembro de ter a iniciativa de te ligar, "cause i like you just the way you are". por mais que esteja mais que prevenida do que vou escutar, essa melodia a que me obrigas estremece-me os sentidos de uma tal forma que já acho um alivio ouvir a tua voz do outro lado da linha. ironia. Apetecia-te conversar. estavas a conduzir à horas e a minha chamada foi uma lufada de ar fresco que te tirou desses pensamentos a que te evades nas longas viagens - disto eu sei.
Notei-te a consciência angustiada. Tinhas necessidade de falar do nosso assunto. Ouvi-te pacientemente e, apesar de ir engolindo em seco, deixei que, à tua maneira, me pedisses desculpa. Sabes bem que é uma benção ser capaz de te olhar nos olhos, e o teu discurso mostra isso mesmo, tens-me num patamar mais alto que a ti mesmo. vale-nos isso, saberes reconhecer os erros. tenho pena que não sejas assim tão bom a emendá-los. deixei-te uma palavra de consolo, e foi tanto que tive a sensação de termos acabado ali um assombro a que nunca veremos o fim. 

"às vezes tenho vontade de te abraçar", disseste. até nisso, até nisso ...
    Olha-me de lado e segreda o meu nome. Sorri-me e apunhala-me nas costas. Traça esquemas e cava valas no meu caminho. Tentas. Olha os fins, não olhes os meios. Imagina. fixa-me no sítio mais moribundo e crava-me de setas. Tentas e não consegues. e cresço a cada mísero gesto teu!
    Nasce-se Homem e cresce-se Animal. Dota-se de razão e cresce-se sem escrúpulos. Cria-se com alma e cresce-se sem moral. Já acreditei que um dia eu e os meus pares mudaríamos o mundo. Ingénua. Enquanto andar meio mundo a guerrear contra si mesmo não há mudança possível. Ser livre, ser singular, viver a dádiva com que a vida nos recheia a cada dia!


"We weren't born to follow"

(IR) racional


Dispo-me de tudo. Esqueço o meu nome e o tudo mais que me persegue. Em mim, gravo agora apenas o que merece ser louvado. Fujo do mundo com o fôlego dos deuses e não ouso olhar para trás. Tristes noites vãs que passei a ouvir-me falar. Porquê? Deixo os instintos beberem do meu corpo e a razão apodrecer numa alma que  foge, etérea. Corro sem rumo nem direcção, piso os ramos secos da vida e galgo os fossos do passado numa busca desenfreada do que ainda não achei. Para quê?  Não sei sequer o que procuro, não reconheço já a noção de procurar. Dispo-me de mim e de ti e de todos e de tudo. e corro. e fujo.


mais um dia ...


Queria escrever sentimentos.
Escrever os que me invadem e traduzir em palavras as emoções que me contorcem de prazer, e de saudade. Queria eternizar numa frase as recordações de horas que agora já só a segundos me sabem. Consumo, assim, cada pequeno detalhe que irrompe de mim com um fulgor descontrolado do que já não volta, com um louco desejo adiado de mais. e mais. Prendo-me a cada cheiro, a cada som e a cada gesto que me lembre esse momento onde toquei o céu. Queria poder escrever sentimentos. Escrevê-los sem medo de os perder ou desgastar.Escrevê-los a prata sobre uma folha de papel vermelha que o tempo não leve nem mate. O prazer de reviver no quando e onde me apeteça multiplicando a cada vez a luxúria de um bem que não passa, mas não retorna.